Hoje este pensante editor completa 40 anos. Fechar uma década é um momento reflexivo para qualquer ser humano. Não importa se são 10, 20, 30 ou 40… a vida humana é finita e mesmo que se atinja a idade secular, a disposição de energia do corpo vai cobrando seu preço década a década.
Se o olhar da mortalidade não é tão visível assim aos vinte, para muitos essa jornada começa a te cutucar aos trinta ou quarenta, pois aí surge as famosas dores, especialmente nas costas, uma grande inimiga dos seres bípedes. Mas outros sinais vão surgindo e você mal percebe. Não bate mais aquele almoço como se você nunca mais fosse almoçar na vida, não sair correndo (a pé) para algum tipo de compromisso senão vai chegar lá como se tivesse acabado de sair de uma piscina e passar a madrugada em claro jogando ou assistindo TV vai se tornar uma missão altamente improvável. Os sinais começam devagar, mas logo estão por toda a parte. Isso é fato.
Tirinha do @galvaobertazzi publicada em suas redes sociais em 29/07/24.
Dito isso, acho curioso que sob a perspectiva de quem acabou de completar 40 anos, sinto que pouco mudei nestas últimas décadas. Houve sim uma evolução, um amadurecimento, mas quando olho para certos adultos ao meu redor, vejo que a vida de muitas pessoas mudam tão abruptamente que se elas voltassem 20 anos no tempo, talvez não se reconhecem mais.
Pessoas envelhecem e param de gostar de coisas que sempre gostaram. Abandonam hobbies. As vezes até soam como velhas vitrolas que só apreciam os mesmos discos. Param de acompanhar novidades. Envelhecer as vezes é um ato que maltrata e amarga algumas pessoas. Algumas trabalham exaustivamente, passam por rompimentos amorosos, se decepcionam e aquela alegria da juventude vai se perdendo. Os traumas da vida as modificam, e elas se perdem.
Claro que também tem as pessoas que se encontram com o tempo. Passam a curtir novas coisas e entendem que estes novos hobbies são muito mais legais do que os antigos. Porém, quando isso ocorre não é como se a pessoa deixasse de gostar daquilo que gostava no passado, é uma troca mais sadia, que respeita aquele passado e não há uma interrupção abrupta da persona com ela mesmo. Bem, não sou filósofo, e nem psicólogo, para expandir isso. Deixamos isso no achismo mesmo.
Tirinha de Jim Davis, criador de Garfield, publicada na GoComics em 17/06/16.
De volta aos meus 40, como estava dizendo, sinto que não mudei tanto assim. Ainda gosto de boa parte de tudo que me divertia desde os anos iniciais, assim como o que foi descoberto na adolescência. Sou adepto da boa leitura, de livros de ficção científica, suspenses e literatura de alto valor mundial, mas também sigo lendo mangás e até mesmo quadrinhos, de Disney aos imutáveis super heróis Marvel e DC.
Videogames? Esse é um universo que faz parte do meu DNA e nunca parece que vai me cansar. Adoro escrever sobre, adoro testar novas ideias e mecânicas, assim como amo certos gêneros. É verdade que com a idade existem muitas situações de “bem, eu já vi isso e não é mais uma surpresa“, e aí a empolgação muitas vezes não é equivalente ao que uma geração gamer mais nova tem para com certas obras. É a primeira vez deles nisso, mas eu já rodei 40 anos nessa estrada e já vi muita coisa. Muita mesmo.
Mas é curioso como jogos eletrônicos é um ponto que evoluiu nas últimas décadas, acompanhou o crescimento das pessoas, mas ainda assim é um dos entretenimento que mais parecem perder as pessoas ao longo de décadas. Há muitas pessoas que jogavam aos 20 e quando chegam aos 40, nem sabem mais o que é videogame. Por que essa desistência? Difícil explicar. Uns acabam enfrentando desafios maiores: a vida adulta, seja profissional, seja do relacionamento, seja dos eventos sociais, seja financeiros. Mas certamente o maior contratempo é o tempo. “Não tenho mais tempo“. Você já deve ter ouvido essa justificativa em algum momento da sua vida. Se não ouviu, espere mais uma década, que ela irá chegar.
Tirinha de Jim Davis, criador de Garfield, publicada na GoComics em 19/06/24.
Pra mim esse é o maior contratempo do envelhecimento: encontrar mais tempo. Cheguei aos 40 e tenho pilhas de coisas pra ler, para assistir, para jogar. E sem qualquer expectativa de que um dia colocarei tudo em dia. Alias, acredito que ter mencionado algo assim em algum lugar quando fiz 30 anos. Nada mudou. Tempo continua sendo o maior inimigo do ser humano.
E aos 40 passamos a perceber como o tempo é realmente cruel. Aos vinte também você ainda não tenha perdido pessoas ao seu redor para a morte, mas conforme você envelhece, esse elemento inevitável da vida passa a lhe rodear. E não estou falando apenas de avós ou velhinhos. Chega um momento da vida em que você encontra alguém que se foi e era mais jovem do que você. A vida dessa pessoa se esgotou cedo demais. Essa é uma das maiores tristezas do envelhecimento, lidar com a perda das pessoas nesse mundo, o buraco deixado e a tristeza que isso causa. Você luta e vence isso, mas a morte é uma constante cada vez maior conforme se envelhece.
Nestes meus 40 já tive algumas despedidas de pessoas que faziam parte desde plano e precisaram ir embora muito cedo. Algumas pessoas se partem repentinamente e as vezes você recorda delas como se ainda estivessem por aqui, de tão presente que suas almas eram nesse plano. Você se recorda de bons momentos com estas pessoas, de suas importâncias aos seus entes queridos, sorri e pensa “ela era uma pessoa incrível.“. Ano passado tive um conhecido que se partiu tão rápido e de uma forma inesperada que você coloca em cheque o propósito da balança da vida e da morte, e quão insano é a roleta a qual vivemos.,
Chegar aos 40 é também uma vitória, e consigo celebrar a memória de todas as pessoas queridas que se foram nos últimos anos. O luto é algo presente, mas que você tem que vencer. Entretanto, sempre fico com a sensação de que pensar na morte é como aquela corrente de ar que passa pelo corpo e vem aquele frio na espinha. Inevitável.
Disso claro que surge aquele pensamento sobre o tempo que lhe resta nesse plano. Já foram quarenta anos, então há uma probabilidade bem alta de que o rolê já está na metade de sua jornada. Para muitos menos, os 50 e 60 anos sempre esbarram em muitos desafios na pasta da saúde. Se cuidar torna-se uma questão essencial. Envelhecer é uma bosta nesse sentido, convenhamos. Só que ficar pensando na sua finitude não é saudável e nem recomendado. Viva enquanto ainda há vida. É um bom lema, não?
Tirinha de Jim Davis, criador de Garfield, publicada na GoComics em 14/06/23.
Muitos também chegam aos 40 pensando em seus objetivos e meta da vida. Angustiados ou preocupados de não ter deixado uma marca no mundo. Será que precisamos de fato de um papel em vida? Nem todo mundo será um grande líder, ou um grande revolucionário, ou alguém famoso, ou um gênio que mudará o curso da humanidade. A grande maioria é só poeira estelar de um cosmo infinito. E está tudo bem!
Penso que a grande sacada de estar vivo é aproveitar os pequenos momentos. Viver um dia de cada vez e desfrutar das pequenas alegrias. Viva para seu bem. Não viva pelo seu trabalho, por metas muitos distantes, pelos outros ou objetivos existências como “vencer na vida“. A vida não é algo pra ser vencida, é para ser vivida. E muitos não vivem (de fato), pois estão tentando vencer algo que é imposto por regras sociais de um sistema que tende a escravizar pessoas, tomar seu tempo, suas felicidades e pequenos prazeres. Não caia nesse armadilha! Ao menos não todos os dias, em todos seus minutos. Tenha responsabilidades, mas não deixe de desfrutar as pequenices da vida.
Da minha parte, chego feliz aos 40 anos. Não me tornei presidente ou alguém importante. Não me tornei milionário ou rico o suficiente para ter uma casa no litoral. Contudo, tive minha cota de conquistas, que me trazem felicidade e tranquilidade para pensar que não joguei fora quatro décadas. Sou feliz por ter encontrado o amor da minha vida muito cedo, e estar com essa pessoa maravilhosa desde então. Claro que passamos perrengues, momentos sombrios e de questionamentos, porém vencemos distâncias, e seguimos juntos, nos amando, todo dia um pouco mais. Sou grato pelo passado e presente, e o futuro, vou descobrir quando chegar lá.
Mas não só isso, tive minhas conquistas como um adulto em uma sociedade cheia de regras. Tenho um emprego estável há anos. Sobrevivi a uma pandemia global. Mesmo aos 40, a tecnologia não me assusta e encaro novidades assim que são arremessadas na minha fuça. Gosto dos meus hobbies e mantenho parte dos mesmos desde que considera um ser pensante. Fiquei mais críticos a certa coisas, enquanto a terapia descobriu novos lados da minha personalidade, de quem sou, que moldaram meu eu de 40. Tenho mais consciência de quem sou, de uma forma que nunca tive na vida. Isso, por sinal, é incrível, pois há pessoas que vivem toda sua finitude e nunca descobrem de fato o que realmente são. E talvez eu seja mais, não sei, espero ter mais algumas décadas para descobrir.
Não posso deixar de comentar que a paternidade também algo emocionante. Talvez minha segunda maior conquista nessa vida existencial (pois a primeira foi ter encontrado um amor genuíno, e não é tão fácil assim). Descrever a sensação de ter um ser criado do zero, educar, vê-lo crescer, descobrir que ele te ama, que você o inspira, a importância de como suas atitudes o moldam e que a sua vida está entrelaçada com esse futuro, inclusive quando não mais estiver nesse plano de vida, é realmente muito difícil de descrever. É um tipo de felicidade que não se põe em palavras. Você apenas a sente.
Tirinha de Jim Davis, criador de Garfield, publicada na GoComics em 15/06/19.
Por fim, para terminar… o aniversário. Essa é uma discussão que vem desde os trinta. Quando se é criando, você adora aniversário. Espera pelos presentes, pela festa, pela celebração. Isso é algo que, ao menos pra mim, se perde com o envelhecimento. Presentes? Ora, essa, sou auto suficiente. Posso comprar o que quiser, quando quiser. Estamos no país do parcelamento e do cartão de crédito. Não tenho que esperar meu aniversário por um videogame ou qualquer outra coisa. É por ser um adulto e poder consumir o que bem entender.
Algumas pessoas apreciam a festa, reunir as pessoas e tal. Bem, isso não funciona comigo devido algumas inabilidades sociais, entre outros dilemas. Aprecio mais a paz, estar com as pessoas que estão comigo todos os dias, e na boa, não existe isso de esperar um aniversário para reunir amigos e pessoas queridas. Como adultos, é possível fazer isso quando bem entender. Festa, por si só, acabou se tornando uma espécie de convenção para encher a barriga de pessoas que você não vê com muita frequência. Particularmente acho uma baita bobagem. Mas tem quem goste. Acho que tudo bem também, pra você claro.
Tirinha de Jim Davis, criador de Garfield, publicada na GoComics em 16/06/23.
Volto a dizer que aos quarenta, prefiro os pequenos momentos. São nestes que reside a genuína felicidade. Não preciso de comemorações. Lembrar que estou ficando mais velho, que meus presentes já comprei ao longo do último ano. Aniversário a gente celebra nos pequenos detalhes. Na felicidade de acordar ao lado de alguém que você ama, de ver seu filho crescer, de estar sem dores e cuidando da saúde. A celebração está nos detalhes que tornam a sua vida feliz aos 40 anos. Quem bom que está tudo bem. Quer presente melhor do que isso?
No mais, nada melhor do que iniciar o dia que você nasceu, tomando café com a pessoa amada, comendo uma coxinha e apreciando estarem juntos. As vezes, é na simplicidade que estão os melhores momentos que se pode ter. Seja seu aniversário, seja um dia qualquer. Apenas aproveite.
Tirinha de Jim Davis, criador de Garfield, publicada na GoComics em 17/06/21.